Artigo
O Jornal Correio do Povo
Em 1895, Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior convidou seus amigos José Paulino Azurenha e Mario Totta para participar da construção de um jornal sem partidarismos. Esse objetivo, na época, era desafiador.
O Correio do Povo surgiu em um contexto de forte acirramento político. Havia apenas dois meses que o Rio Grande do Sul fora cenário da sangrenta Revolução Federalista (1893-1895), e apesar de o Partido Republicano Riograndense (PRR) consolidar sua hegemonia após o conflito, ainda havia forte oposição e tensão política e isto estava presente nas páginas dos jornais.
Por isso, foi significativo que Caldas Júnior tenha optado por imprimir seu periódico com páginas em tom rosado. Nem vermelho, nem branco, era a representação gráfica da sua pretensão de neutralidade. O tom rosado das primeiras páginas do Correio lhe renderam o apelido de “róseo”.
Seu primeiro número começou a circular pela cidade de Porto Alegre em 1º de outubro de 1895 e sua primeira tipografia estava localizada na Rua dos Andradas, nº 132. O róseo tem uma longa relação com a Rua dos Andradas. Sua primeira tipografia funcionava nesta rua e em 1899, mudou de número, do 132 para o 317. Em janeiro de 1946, o Correio mudava para seu novo endereço no edifício Hudson, na esquina da Rua Paissandú com a Rua dos Andradas.
A renomeação para Rua Caldas Júnior é uma homenagem referente a importância do Correio do Povo para a comunicação em Porto Alegre e no Rio Grande do Sul.
A INFORMAÇÃO INSTANTÂNEA
Nos séculos XIX e começo do XX, os jornais contavam com um serviço telegráfico que informava as notícias internacionais mais rapidamente. Na ocasião da morte de Louis Pasteur, em setembro de 1985, o jornal recebeu a informação apenas depois de sua edição já ter sido composta, impossibilitando a inclusão da mesma. Acontece que Caldas Júnior era grande admirador e valorizava muito o trabalho científico de Pasteur, por isso, mandou antecipar a notícia em um quadro negro do lado de fora do prédio do Correio. A prática ficou conhecida, posteriormente, como placard, e passou a ser utilizada por outros jornais, fazendo com que a população se reunisse na porta dos jornais para informar-se.
OS COMENTÁRIOS SOBRE A CHEGADA DO CORREIO DO POVO:
Os jornais estabeleciam diálogos entre si. Dessa forma, o início do Correio do Povo contou com comentários em outros jornais. O Jornal do Comércio , onde Azurenha e Caldas Jr. haviam trabalhado, registrava na primeira página a chegada do Correio do Povo, elogiava a classe e o acerto do jornal e desejava sucessos e longa duração. Havia grande expectativa sobre a reação de A Federação. Afinal, os fundadores do Correio do Povo eram egressos do Jornal do Comércio, que não procurava apoiar o governo. Mesmo assim, naquela tarde de 1895, a primeira página de A Federação afirmava que: “Apareceu esta manhã o 1º número do Correio do Povo interessante e bem cuidada folha diária que acaba de fundar nesta capital, o nosso inteligente colega Caldas Júnior. As nossas saudações ao Correio.”
OS JORNAIS CONCORRENTES NA CIDADE DE PORTO ALEGRE:
No lançamento do Correio do Povo, outros 07 periódicos também estavam disponíveis nas bancas de jornal: A Federação, que atuava como jornal oficial das idéias e interesses do Partido Republicano Rio-Grandense, apoiando o governo estadual; a Gazeta da Tarde; A República; O Dia, considerado de oposição a Júlio de Castilhos; o Deutsche Volksblatt, jornal católico em língua alemã; O Mercantil, com forte tendência católica; e o Jornal do Comércio, com forte influência de idéias do Partido Liberal e que já estava consolidado no mercado (circulava desde 1865). Além desses circulavam também a Gazetinha e O Trinta e Cinco, este último apresentava-se como “periódico literário, humorístico e noticioso”.
RIVALIDADE ENTRE JORNAIS
Em sua chegada às bancas, o periódico encontrou sete concorrentes, cada um deles tinha um viés de comunicação e alguns eram bastante enfáticos nas defesas de ideias políticas e sociais. comum que esses jornais estabelecessem diálogos entre si, por isso, quando o Correio do Povo chegou às bancas, diversos periódicos publicaram boas vindas ao novo meio de comunicação gaúcho.
A qualquer momento a cordialidade poderia se transformar em hostilidade. Em um período onde os jornais exibiam fortes identificações com ideias e interesses, qualquer discordância podia gerar ataques e discussões calorosas. O Correio do Povo buscava manter-se neutro às polêmicas, porém, em função de seu tom moderadamente hostil ao Castilhismo, alimentou uma rivalidade com o jornal A Federação, ao qual se referia como “jararaca” e que o apelidou de “folha maragata disfarçada”. O confronto teve altos e baixos, momentos mais velados e outros mais explícitos, e no auge da crise d’A Federação, o Correio chegou a afirmar que a “jararaca havia perdido seu veneno”.
Texto escrito por Renata Kaupe Veleda, Historiadora e Coordenadora do Setor Educativo do MuseCom.
Bibliografia
FRANCO, Sérgio da Costa. Gente e espaços de Porto Alegre. Porto Alegre: Ed. Da Universidade/UFRGS, 2000
GALVANI, Walter. Um século de poder: Os bastidores da Caldas Júnior. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1995
LEITE, Carlos Roberto Saraiva da Costa. A Federação: um jornal que fez história. Disponível em: https://www.observatoriodaimprensa.com.br/memoria/federacao-um-jornal-que-fez-historia/