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Publicado em 23/03/2022, 18:34

Porto Alegre, 14 de maio de 1987.

Bairro Partenon. Assaltantes agem no Supermercado Dosul. Uma menina de 13 anos e seu irmão de 11 anos são feitos de reféns. Um homem cai no chão ao sofrer um ataque epilético. Populares o apontam como um dos integrantes do grupo de bandidos. Ele é levado preso dentro da viatura da Polícia, para horas depois chegar sem vida ao IML com tiros no tórax e abdômen.

“Julio Cesar tornou-se suspeito pelo simples motivo de ser preto e estar sem documento”, 

Esta foi frase que Teresa Canabarro, parente do operário utilizou para explicar a violência policial sofrida por Julio Cesar. (o texto integra a notícia “Caso reabre o debate sobre racismo”, publicada no jornal Zero Hora no dia 24 de maio de 1987). 

Julio Cesar de Melo Pinto era um operário de 30 anos, casado. Sua morte foi o centro de debates sobre o racismo institucional e diversas manifestações de grupos como o Movimento Quilombista do Rio Grande do Sul (Negritude em ação). O operário foi levado, como assaltante, pela viatura com vida, mas não teve a oportunidade de se defender legalmente. Foi executado antes disso. Julio Cesar  ficou marcado na história como “o homem errado”.  

Qual é o papel da imprensa na cobertura de certos fatos?

Os registros fotográficos da imprensa foram importantes na denúncia da brutalidade policial. O fotógrafo Ronaldo Bernardi registrou o momento em que Julio Cesar foi levado e também a sua chegada ao IML. Houve ampla cobertura do caso, ocupando um espaço relevante na investigação do assassinato. Ao longo do mês de maio, várias reportagens denunciaram as contradições entre os relatos dos policiais e as imagens captadas pelo fotógrafo. 

Além da violência policial, o sigilo da investigação sobre os policiais gerou revolta da Comunidade Negra que se organizou e contribui para a repercussão do caso. Podemos encontrar nos jornais registros da luta do Movimento Negro por justiça.  Em busca de justiça, lideranças negras se reuniram com o Procurador de Justiça do Estado solicitando acesso ao inquérito policial. Conseguiram, porém, apenas a promessa do procurador de que este  acompanharia a investigação. Dessa forma, a divulgação do caso  e o envolvimento do Movimento Negro na verificação dos fatos foi uma estratégia pressão social.

Em 2018, a cineasta Camila de Moraes realizou o documentário “O caso do homem errado”, onde relembra a morte de Julio Cesar. Esse resgate de um episódio extremamente violento nos convida a refletir sobre o quanto o racismo mata em nosso país, em nossa cidade.

Observando sua cidade, a periferia ocupa o mesmo espaço que o centro? 

Porto Alegre é a cidade onde ocorreu um assalto em um supermercado em 1987 e um homem foi assassinado ao acompanhar o fato. Porto Alegre é a cidade onde uma morte foi filmada no estacionamento de um supermercado em 2020. 

Quantos homens “errados” vivem aqui?