Artigo
A Porto Alegre de José Montaury
Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite
Conhecido como o “eterno intendente” (prefeito) da Capital gaúcha, José Montaury de Aguiar Leitão (1858-1939) era natural de Niterói (RJ) onde se graduou, em Engenharia Civil, na famosa Escola Politécnica, na qual estudaram figuras que se tornaram ilustres no cenário nacional.
Ao exercer o cargo de funcionário federal, da Comissão de Terras e Estabelecimento de Imigrantes, no Rio Grande do Sul, ele teve a oportunidade de conhecer várias cidades gaúchas. Homem de confiança de Júlio de Castilhos (1860-1903) e de Borges de Medeiros (1863-1961), Montaury militava nas bases do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), tendo sido indicado pela cúpula do poder político, para concorrer ao cargo de intendente municipal. De acordo com a historiadora Margaret Bakos, em seu livro Porto Alegre e seus eternos intendentes (2013), Montaury foi eleito e reeleito, por sete vezes consecutivas, no período de 15 /03/1897 até 15/10 /1924, governando Porto Alegre durante 27 anos.
O pioneiro
No ano 1897, ele criou o serviço de Assistência Pública do País, que incluía postos de primeiros socorros e o atendimento à população carente. Porto Alegre foi a primeira capital, no Brasil, a implantar este serviço.
O progresso da Urbe
Em sua importante obra, O Príncipe Negro (2007), o jornalista Roberto Rossi Jung nos narra que, neste período, o crescimento econômico e populacional de Porto Alegre ocorreu graças ao comércio do seu porto, ao fluxo de imigrantes alemães, italianos e a uma parcela da população negra que, após a Abolição da Escravatura (1884) ocorrida, na então Província de São Pedro (RS), quatro anos antes da Lei Áurea (1888), dirigia-se à Capital em busca de trabalho. O censo de 1900 registrou 73.474 porto-alegrenses.
Ao iníciar o século 20, o viajante alemão Schwartz Bernard, quando visitou Porto Alegre, considerou a cidade progressista, aproximando-se do modelo europeu de urbanidade.
Símbolo da arquitetura positivista
Durante a administração de Montaury, foi construída a antiga Prefeitura Municipal, cuja arquitetura, de influência positivista, ficou a cargo do engenheiro João Cattani, tendo sido o autor do projeto o arquiteto veneziano Luiz Carrara Colfosco. Inaugurado em 1901, o prédio representa a hegemonia, na época, do Partido Republicano Rio-Grandense (PRR). Neste local, durante anos, Montaury despachou, em uma época na qual o voto não era secreto e as mulheres não participavam do pleito.
A indústria
Ainda em 1901 ocorreu a importante Exposição Agroindustrial, no Campo da Redenção, atual Parque Farroupilha, exibindo novas tecnologias e os produtos que moviam a nossa economia. No contexto econômico foram surgindo, em nossa Capital, nossas primeiras fábricas: a Neugebauer (1891), Gerdau (1901) e a Wallig (1904). O viajante Wilhelm Lacmann, em 1903, deixou-nos o seguinte registro:
“Porto alegre possui, proporcionalmente, um próspero parque industrial. Áreas tais como: construção de navios, pregos de arame, móveis, artefatos de vidro sabão, fazendas e chapéus. A indústria porto-alegrense é protegida por elevados impostos para importação, o que proporciona a continuidade de sua prosperidade.”
Agremiação Literária
No campo literário, após uma reunião preparatória na casa do jornalista e escritor afrodescendente Aurélio Veríssimo de Bittencourt (1849-1919), foi criada a Academia Rio-Grandense de Letras. Composta a sua diretoria, ele se tornou seu primeiro presidente (Franco, 2012).
O Futebol
Na Porto Alegre de José montaury, no período de 1903 a 1908, havia apenas dois times: o Grêmio e o Fuss Ball, ambos com a predominância de alemães e seus descendentes. No dia 04 de abril de 1909, fundou-se o Sport Club Internacional por descendentes de italianos. Todos estes clubes, em seus primórdios, não aceitavam negros em seus quadros. Esta discriminação motivou a criação da Liga da Canela Preta, reunindo nove times, na década de 1910, com a participação de negros, mulatos e sararás.
O seu surgimento possibilitou aos jogadores das camadas menos favorecidas economicamente, principalmente os afrodescendentes, a criação de um espaço de atuação mais visível , por meio do esporte, e de resistência político-cultural. O quadro da Liga da Canela Preta era composto pelos seguintes times: 8 de setembro, Rio-Grandense, Bento Gonçalves, Primavera, 1º de Novembro, União, Palmeiras, Aquidabã e Venezianos. Os jogadores eram oriundos dos territórios negros de Porto Alegre como a Colônia Africana (Atual Bairro Rio Branco), antiga Ilhota (imediações do Ginásio Tesourinha e do Centro Municipal de Cultural), Areal da Baronesa (limite entre os bairros Cidade Baixa e Menino Deus) e Mont’Serrat.
O primeiro Museu
Criado, em Porto Alegre, em 1903, o Museu do Estado, a partir do decreto de 19 de julho de 1907, passou a denominar-se Museu Júlio de Castilhos. Dirigido, atualmente, pela museóloga Doris Couto, é o mais antigo do estado.
Saneamento, eletricidade e transporte
Associada à modernidade, a necessidade de saneamento levou à Intendência Municipal a comprar, em 1904, a Companhia Hidráulica Guaibense, dando início à construção da casa de bombas na Rua Sete de abril, esquina com a Rua Voluntários da Pátria, para bombear água aos reservatórios localizados em terrenos nos Moinhos de Vento. Em relação ao saneamento da nossa Capital, o viajante Vittorio Bacelli , em 1905, registrou:
“O serviço de limpeza urbana de Porto Alegre pode ser apontado como modelo a muitas cidades europeias (…).”
Em 1906, criou-se a Companhia Força e Luz Porto-Alegrense, que passou a gerar energia elétrica e a implantar novas linhas de transporte dos bondes elétricos, substituindo as antigas maxambombas com atração animal (mulas ou cavalos). Havia, na época, duas empresas de transporte de bondes: a Carris de Ferro e a Carris Urbanos que se uniram, originando esta companhia.
E surge o automóvel ...
Importado da França e adquirido pelos irmãos Grecco, que eram proprietários do cinema Apollo, o primeiro automóvel – símbolo de modernidade - circulou, na Capital, em abril de 1906. O fato curioso, acerca deste primeiro veículo – um modelo “De Dion Bouton” - é que o único homem que sabia dirigir, em Porto Alegre, encontrava-se preso na Casa de Correção. Por meio de uma solicitação oficial, os irmãos Grecco se responsabilizaram, conseguindo, desta forma, a liberação do detento, que se tratava do italiano Marini Constant. Este os levou, na condição de motorista, a um passeio pelo centro da Capital, onde posaram para fotos. Acompanhando os irmãos Grecco, encontrava-se o famoso fotógrafo amador Lunara, cujo verdadeiro nome é Luiz do Nascimento Ramos (1864-1937). O mais antigo jornal da Capital, ainda, em circulação, o Correio do Povo (1895), publicou, em abril de 1906, a chegada do primeiro “auto” em Porto Alegre.
Lunara
O trabalho de Lunara foi marcado pelo registro de personagens e lugares, na época, invisibilizados pela elite da nossa cidade, como a significativa presença africana e de imigrantes. Graças a ele, parte desta história, hoje, compõe nossa iconografia, sendo objeto de estudo acadêmico, visando a recuperar esta memória apagada pela historiografia oficial, por considerá-la, na época, um subproduto cultural. De acordo com os padrões, que eram vigentes, fotografar um detento, entre os ditos “cidadãos do bem”, era inconcebível, No caso de Lunara, o advérbio de negação, em nome da arte, era descartado. Existe uma fotografia, localizada pela pesquisadora e fotógrafa Eneida Serrano, na qual aparece Lunara e os irmãos Grecco instalados no famoso veículo.
O detento, que conhecia a mecânica e a operação de veículos motorizados, sentiu-se, naquela ocasião, com certeza, o homem mais importante da cidade. Após a sua liberação temporária, Marini Constant retornou à cadeia, mas o seu feito o introduziu na galeria dos nomes que fazem parte da História da nossa cidade.
A Primeira Greve Geral da Capital e o operariado
Em outubro de 1906, eclodiu, na Capital, “A Greve dos 21 dias”, na qual os líderes - o afrodescendente Francisco Xavier da Costa (socialista) e Polidoro Santos (anarquista) -, reivindicavam oito horas de trabalho e melhores salários para os operários. Esta greve geral foi a primeira no Rio Grande do Sul e obteve conquistas importantes para o operariado, embora os confrontos e prisões ocorridas.
A Educação
Na área da educação, durante a gestão Montaury, surgiram tradicionais estabelecimentos de ensino, como Sevigné (1900), Rosário (1904), Bom Conselho (1905), Parobé (1906) e Nossa Senhora das Dores (1908). Já no campo do ensino superior, foram criadas as nossas primeiras universidades: Faculdade de Farmácia (1896), Engenharia (1896), Medicina (1898) e Direito (1900), dando início à vida acadêmica em Porto Alegre.
Ainda no ano de 1906, criou-se, em Porto Alegre, o Instituto Técnico Parobé, visando a qualificar o operário, por meio do ensino profissionalizante e técnico de acordo com a doutrina positivista de Augusto Comte (1798-1857), que foi adaptada, em nosso estado, com o nome de “Ditadura Científica”, servindo de inspiração a Júlio de Castilhos na elaboração da nossa primeira Constituição Estadual de 1891.
No MuseCom, há um exemplar impresso e original desta Constituição, escrita por Júlio Prates de Castilhos, cuja marca é o seu centralismo político, fortalecendo o Poder Executivo, em detrimento do Legislativo, reeleições sucessivas, além do voto a descoberto , que segundo o discurso positivista tornava a votação transparente, “às claras”. Na realidade, esta prática facilitava a fraude eleitoral e a perpetuação no poder.
Segundo o nosso historiador Sérgio da Costa Franco, esta Constituição foi motivo de duas revoluções que deixaram marcas no Rio Grande do Sul: A Federalista (1893-1895) - a mais sangrenta com a presença massiva da prática da degola, totalizando 10.000 mortes -, e a Libertadora ou Assisista (1923) na qual o grupo republicano dissidente - liderado por Assis Brasil (1857-1938) - aliou-se à facção maragata (oposição), para combater o governo de Borges de Medeiros, que se perpetuava no poder por meio de eleições fraudulentas.
A política de alfabetização, implantada pelo Presidente do Estado Borges de Medeiros, acompanhou também o desenvolvimento da Capital, impulsionado durante a gestão de José Montaury.
Espaços de sociabilidades
O modelo burguês europeu do “bem viver” era reproduzido nos espaços de lazer da cidade, como as sociedades, as confeitarias, os cafés, os hipódromos, o velódromo (ciclismo), os clubes de remo, as sessões de cinematógrafo e o tradicional “footing” da Rua da Praia. Considerada a mais antiga e tradicional rua da cidade, nela os “cidadãos de bem” passeavam, exibindo o vestuário da moda. Quanto à sua importância, o viajante Annibal Amorim assim registrou entre 1907 e 1908:
“Em Porto Alegre cada rua tem dois nomes: um popular outro municipal. É uma confusão diabólica para o recem vindo. A dos Andradas é a mais importante. É mesmo a via publica da moda.“
O porto-alegrense, com menor poder aquisitivo, divertia-se pelos botequins, quiosques, e bailes populares. A elite frequentava espaços antigos, seletivos e tradicionais da cidade, como o Theatro São Pedro (1858) a Sociedade Esmeralda (1873), a Sociedade Germânia (1855) – a mais antiga da nossa Capital - e a Vittorio Emanuelle (1877), além dos banquetes no famoso Grande Hotel (1918) e no Clube do Comércio (1896).
A comunidade afrodescendente frequentava a tradicional Sociedade Floresta Aurora (1872). Fundada, por negros alforriados, é a mais antiga no Brasil, ainda, em atividade. Nela, os afrodescendentes buscavam reproduzir o modelo burguês das outras sociedades frequentadas pela elite porto-alegrense. Havia também a Sociedade Os Venezianos, de caráter mais popular, que rivalizava, em seus desfiles carnavalescos, com a Sociedade Esmeralda.
Espaço tradicional de encontro e lazer dos porto-alegrenses, o Chalé da Praça XV, construído no ano 1885, na Praça Conde d"Eu, atual Praça XV, era voltado à venda de sorvetes e de bebidas. Demolido, foi construído, em 1911, no mesmo local, em estilo "Art-Nouveau", um novo chalé durante a gestão do prefeito José Montaury. O prazer de ser fotografado pelos antigos lambe-lambes e encontrar-se com os amigos, nesse local, constituía-se numa prática do cotidiano do porto-alegrense. O Chalé da Praça XV, até os dias atuais, faz parte da nossa história patrimonial e cultural.
A rede de esgotos da cidade
De 1907 a 1912, foi sendo implantado o nosso primeiro sistema de esgotos cloacais. Os resíduos eram recolhidos nas residências, casas comerciais e despejados no Guaíba. Na Capital, graças à sua política de saneamento, o percentual da mortalidade infantil, que atingia a faixa de 32,2%, reduziu-se a 17,9%. Em 1914, ano em que eclodiu a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), concluiu-se o primeiro Plano Geral de Melhoramentos de Porto Alegre, criado pelo engenheiro-arquiteto João Moreira Maciel.
A Gripe Espanhola
No fatídico ano de 1918, a partir do mês de outubro, surgiram os primeiros casos da Gripe Espanhola, causando, ao longo de três meses, 1.316 óbitos numa população de 192 mil porto-alegrenses. Diante do pequeno percentual de médicos, Montaury dividiu a cidade em 33 quarteirões, onde em cada um havia um médico e estudantes de Medicina, para atender a um número significativo de doentes.
Muitos profissionais foram contaminados, durante esta epidemia, e faleceram, como registra o livro publicado, em 1998, pela editora PUC / RS , cujo título é “A História de Uma Epidemia: A Hespanhola em Porto Alegre, 1918”, da historiadora Janete Abrão. Durante a sua pesquisa, o acervo do MuseCom , principalmente, por meio de sua importante he- meroteca, foi imprescindível na conclusão exitosa de seu trabalho.
O visual citadino / arquitetos e engenheiros
Com o apoio da burguesia, muitos prédios que, atualmente, são importantes patrimônios culturais de Porte Alegre -, foram construídos durante a gestão de Montaury. De 1908 a 1930, o arquiteto teuto Theo Wiederspahn (1878-1952), realizou inúmeros projetos na Capital, a exemplo da Delegacia Fiscal da Fazenda no Estado (1914), que, desde 1978, é sede do Museu de Arte Ado Malagoli (MARGS) e do antigo Hotel Majestic (1916-1933) onde, a partir de 1990, passou a funcionar a Casa de Cultura Mário Quintana.
No ano de 1909, chegou à Capital, vindo da França, o arquiteto Maurice Gras, que assinou o contrato para a construção do atual Palácio Piratini. No ano de 1912, o eng. Affonso Hebert, deu início as obras da Biblioteca Pública, cuja continuidade desta construção ficou sob a responsabilidade do engenheiro Teófilo Borges de Barros. Suas fachadas se tratam de uma verdadeira obra de arte, onde podemos apreciar o “Calendário Positivista”, cujo conjunto escultórico é composto de bustos dos grandes vultos da humanidade. Atualmente, este nobre espaço cultural é dirigido por Morgana Marcon. Ainda em 1912, em nossa cidade, foi fundado o tradicional Colégio Militar.
A Porto Alegre pela lente de Virgílio Calegari
As transformações que mudaram o visual citadino e o comportamento dos porto-alegrenses, sob a influência do positivismo, foram registradas pela lente de um dos grandes nomes da arte de fotografar: o ítalo-brasileiro Virgílio Calegari (1868-1937). Seu famoso atelier se localizava na Rua da Praia, entre a Caldas Júnior, antiga Payssandu, e a General João Manoel, que era, na época, conhecida como a quadra dos italianos. Frequentar seu estúdio era símbolo de status. Suas fotografias ilustram revistas importantes que circularam, naquela época, como a Máscara (1918-1928), Kodak (1912-1923) e a Revista do Globo (1929-1967). Enquanto o fotógrafo Lunara privilegiou os personagens e espaços invisíveis, na época, aos olhos da classe dominante, Virgílio Calegari registrou as transformações da Urbe e personalidades de destaque social, como a esposa de Borges de Medeiros, chamada Dona Carlinda, entre outras.
A nova sede do jornal que apoiava o correligionário Montaury
Durante a gestão de José Montaury, a ampliação da antiga Travessa Paysandu, atual Rua Caldas Júnior, na esquina com a Rua dos Andradas, possibilitou a construção da nova sede do jornal A Federação (1884-1937). Órgão do Partido Republicano Rio-Grandense, este prédio foi construído pelo engenheiro Teófilo Borges de Barros, tendo sido inaugurado, em 06 de setembro de 1022, durante as comemorações do Centenário da Independência do Brasil (1822-1922), contando com a presença das autoridades da época, entre outras do presidente do Estado Augusto Borges de Medeiros, e representantes dos principais jornais que circulavam na época. A bela estátua, que representa a Imprensa e decora a fachada principal do prédio, é de autoria do escultor italiano Luis Sanguin (1877-1948).
Desde 10 de setembro de 1974, este local abriga o Museu da Comunicação Hipólito José da Costa (MuseCom), que completará seus 46 anos de atividades culturais junto à sociedade gaúcha. Fundado durante as comemorações do bicentenário (1774-1974) de nascimento de Hipólito José da Costa (1774-1823) - “Patrono da Imprensa no Brasil”- o museu tem como missão a guarda, a preservação e a difusão da memória da Comunicação, sendo, atualmente, dirigido pelo museólogo Welington Silva.
Aquiles Porto Alegre (1848-1926)
O jornalista e escritor Achyles Porto Alegre, em seu livro “Através do Passado”, pp 45-6, narra as transformações do dia a dia da urbe de maneira quase poética, como registra este trecho de uma das suas crônicas:
“Ao invés da iluminação azeite de peixe – a luz elétrica, ao invés da maxambomba, que não matava ninguém – o elétrico e o auto, que como epidemia, estão sempre fazendo vítimas – eis o que o progresso nos trouxe. É doloroso – mas é bonito. Não temos mais frades de pau à porta de casa, nem, de pedra às esquinas. Temos postes telefônicos e de luz elétrica, que nos trazem a casa, de longe, num relâmpago, a palavra e a luz”
As mudanças políticas e o fim da Era Montaury
Com o Tratado de Paz de Pedras Altas, assinado em 14 de dezembro de 1923, encerrou-se a Revolução de 23 ou Assisista, ficando estabelecido, em uma das suas cláusulas, que não haveria mais reeleições. Indicado pelo Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), Getúlio Dornelles Vargas (1882-1954) decidiu concorrer à próxima eleição e venceu, assumindo ,em 1928, o governo do Rio Grande do Sul. Com o final da chamada “Era Borges”, nosso prefeito José Montaury teve seus mandatos sucessivos encerrados, pois já não contava com a sustentação política de Borges de Medeiros, que governou o Rio Grande do Sul por mais de 20 anos. Com a mudança da Lei Orgânica de Porto Alegre, a reeleição se tornou proibida.
No ano de 1924, Montaury deixou a prefeitura, passando esta a ser dirigida por seu sucessor Otávio Rocha (1877-1928), que deu continuidade ao projeto de modernização de Porto Alegre, modificando ainda mais a paisagem urbana da nossa cidade. A pesar do progresso citadino presente na administração de Motaury, a oposição, por meio da imprensa, criticava a sua figura pelo fato ser solteiro, ter nascido no Rio de Janeiro, ou seja, não ser gaúcho e não possuir uma residência própria em solo gaúcho. Seu governo também enfrentou críticas de pagar altos salários aos funcionários municipais e de fraudular os orçamentos de Porto Alegre.
A Frente Única Gaùcha (FUG)
Somente Getúlio Dornelles Vargas, sucessor de Borges de Medeiros , em 1928, conseguiu, por um período, acalmar os ânimos da dicotomia presente na política gaúcha, quando criou a Frente Única Gaúcha, unindo eternos inimigos políticos. Neste contexto, chimangos (lenço branco) e maragatos (lenço vermelho) somaram forças, visando a conquistar o poder federal sob a liderança de Getúlio Vargas. Com a eclosão da Revolução de 30, a partir da formação da Aliança liberal (Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Paraiba), ele conquistou o poder federal, inaugurando a Era Vargas.
O prefeito José Montaury, quando faleceu em 1939, era um homem pobre. Diante desta realidade, a acusação, direcionada à sua figura, de fraudular os orçamentos do município, torna-se utópica e irrelevante. Sem herdeiros imediatos, deixou apenas os vencimentos do último mês: 400 mil réis, uma soma inferior a dois salários mínimos da época. No ano de 1922, ele foi homenageado por meio de uma moeda alusiva aos 100 anos da elevação de Porto Alegre à categoria de cidade (1822) e, atualmente, “ O Eterno Intendende” – José Montaury - é nome de uma rua em Porto Alegre.
Bibliografia
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